segunda-feira, 16 de novembro de 2009

E ele ainda lembra-se dela. Ele ainda a vê nua junto à sua cama. Observava com louvor seu jeito bailarino de movimentar-se. Nunca poderia ser de outra novamente. E, por mais que as mulheres que amou tenham sido como as frases escritas num diário secreto e tenham inspirado seu próprio conhecimento só ela, somente ela fora tão suave e intensa quanto à brisa na madrugada chuvosa.

E hoje ele pode vê-la, sentada no parapeito de uma janela velha deixando os pingos de chuva limpar e molharem seus pés belos, sujos e muito, muito cansados. Suas costas apoiadas na veneziana aberta, ela se move sem cuidado e as maltrata.
Ampla pradaria onde ele era o tocador do gado.

Quantas vezes lhe dissera pra tomar cuidado com as janelas! Mas ela não tinha medo, sentava-se sempre à beira de qualquer uma. Pois sabia que ele estaria sempre ali para salvá-la.

Mas, naquele tempo ela era Nua e estava presa. Sufocada por algo que ele nunca poderia compreender. Seu corpo era manejado por suas mãos como o baú cheio de ouro que Dantes encontrou após anos de injusto calabouço.

E ainda assim ela soube como portar-se diante dele. Assim o era e assim continua sendo.

Mas ele tem a incômoda certeza de que hoje, ela está nua e que outras mãos ousam abrir seu baú de tesouros levando-a cada vez mais pra longe dele. E ele também compartilha da dor desses outros desbravadores que, desvelados acordam no meio da noite e não são capazes de compreender por que ela já não está mais ao lado deles. Tocando a ausência precoce.

Ele a vê profanando o sagrado altar em que eles se casaram, num dia infinito em que ele a vestiu de noiva com sua pele branca. Há muito tempo atrás.

Mas o que ele não sabe é que ela é Livre.

Ela está sentada e por cima de sua cabeça há um céu estrelado. Ás vezes tenebroso.

Deveria ela deixar de pintar suas partes com cores fortes?

Tudo se modifica na cidade de Pedra em que hoje vive. Ela caminha pelas vitrines e seu rosto está por toda parte. As pessoas a olham em belas roupas e não vêem a grande rosa habitando sua caixa branca., sussurrando para dentro de sua alma a mais bela das orações.

Ela ama, mas está cansada de ficar em pé.

Ela tem saudade. Mas cansou-se de chorar, de fazer e de não poder ser.

Ela tenta. Faz, desfaz e descobre que a moça das pernas mutiladas caminha com dificuldade, mas mantém sempre um sorriso. Ela também tem o jardineiro que, assim como ela, está só.

Canta e ninguém a escuta.

É como se a Vida passasse por ela como um trem que não para em nenhuma estação.

E ela corre, corre e suas pernas doem. E continua a correr e a sua frente há uma estrada longa. E ela só deseja que os seus não a esqueçam e que ele (cir) ande não muito longe dela para que esse primeiro e louco amor nunca a deixe completamente.

Com anéis nas mãos ela caminha e recebe com muito prazer a visita daquela mulher de cabelos longos e negros.

No fundo, aqueles meninos que mal sabiam do mundo e apenas iniciavam sua jornada em busca de descobrir o amor sempre quiseram que o Cantor lhes dedicasse nem que fosse uma única canção.

A Malone. Por ter, com muita dificuldade, me confessado tal história.

Um comentário:

  1. Um texto que não consegui fazer a ligação de outra maneira que não fosse incluindo a imagem da rosa que me inspirou a escrevê-lo. Perdoem os mais eruditos que não utilizam imagens em seus escritos. Aqui entra como complemento essencial. E quem acompanha o fio condutor de minha escrita sabe que trabalho a partir da Musa.

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