domingo, 15 de abril de 2012

Acerca do Vazio (II)

Talvez fosse num lugar calmo assim que viria a encontrar Malone depois de tantos anos. Um ambiente a céu aberto, com luzes saindo do solo, o som de gangorras e gira-giras ao longe onde estaríamos sentados como dois bons irmãos que nunca haveríamos de ter e o vento sopraria carícias a nossos pés descalços.

Enquanto fumava um cigarro a música ao longe ensaiava começar, ele gosta de me ver assim. Sua presença me desafia pois ainda que eu insista em desafiar-me com ausências suas eu me sinto muito bem quando em momentos indecifráveis como esse me encontro só e feliz. Como se fosse uma espécie de medo da voraz realidade de que um ser pode ter plenitude consigo mesmo e mais nada.

Há quem prefira esquecer e há quem prefira insistir. Eu pensava no menino que talvez nunca me mostrasse sua alegria e sentia que feliz não era e não havia nada que eu pudesse fazer para salvá-lo a não ser pacientemente aguardar no mais puro silêncio que pudesse aguentar.

Nesse lugar eu via o mundo: pais e filhos, o casal que se deixava descansar pelo ruído da água atrás de suas cabeças, ora ele, ora ela (senti uma ponta de nostalgia ao observá-los); um grupo de jovens avassaladoramente sorridentes e a noite caindo por em cima de meus cabelos lavados.

Eu pairava suspensa ou seria o próprio mundo se consumindo pouco a pouco até encaixar certinho dentro do meu peito sempre ansioso (e às vezes até morto) nessa grande vontade de viver que lhe agradava e outra vez lhe cansava?

Tal como a fumaça que trago, me invade e me abandona em tão poucos segundos.


Dedicado a momentos e pessoas caóticas que me preenchem, me abalam e vivem a me ensinar.

14/04/2012

2 comentários:

  1. Olá Sr.Malone!

    Sempre tive desde a adolescência a incomoda experiência de que meus interlocutores, pensavam naturalmente que eu compartilhava de seus pensamentos e sentimentos; porisso sempre os via afirmar sobre mim, sem hesitação a partir de suas posições, na certeza de que sabiam sobre mim.
    Foi a partir dessa compreensão que decidi me desfazer dos rótulos que colavam em mim, como tambem me distanciar da nomenclatura intelectual em que me achavam integrado.
    Havia deixado de ser um marginal ou desviado, ao ponto de ter para alguns, a aparência de um pensador contemporâneo, incomum e notável:(intelectual de esquerda). Por isso lhe afirmo ser fiel somente a mim mesmo.
    Vejo Sr. Malone, que apesar da sua prática introspectiva, esta na maioria das vezes, ao lado de si mesmo e, em certos momentos, justamente por se ver em seu outro, em certos experimentos; verifico uma incerteza psicológica: não se pode, ao mesmo tempo observar-se plenamente e viver plenamente. Preso ao personagem de si mesmo. Percebo, as vezes, a presença de seu duplo muito próxima, estranho a si mesmo; observa-se a partir de seu duplo. Enfim, reconheço em si um abismo infindável, que, aomesmo tempo sendo-lhe muito pessoal, é o de cada um e de todos.
    Talvez Sr. Malone o Sr. venha a ser uma ilusão, e isso pode incorrer em erros na sua narrativa, na exposição dos fatos vivenciados, a começar pela ilusão e pelo erro sobre si mesmo.
    Aguardo ansiosamente sua próxima narrativa, talvez um parecer. Obrigado Sr. Malone.
    Sem mais,

    SIDNEY NUNES

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  2. Para Malone um parecer sobre si mesmo seria o próprio erro. Pois com o tempo e o que vivenciou soube que jamais poderia se auto-definir e é isso mesmo que o fez seguir vivendo.

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