terça-feira, 13 de outubro de 2009

Dia das Crianças

Foi bem ontem, logo ontem. Ela sentou-se na cama, Vou ler uma coisa pra você. Cruzou as pernas grossas e lívidas, precocemente cansadas e marcadas dos caminhos que caminhou. Ela gosta de ler coisas pra mim. Ela gosta de mim. Com a voz baixa e calma, como se soubesse exatamente no que eu estava pensando cantou-me aquela poesia. E eu a admirei ainda mais, porque ela sabia exatamente o tom que deveria dizer-me aquelas palavras, porque nós somos mais do que meras estranhas da noite.

E você soube ir? Claro que não, inclusive deixei meu telefone aqui pra poder voltar. Eu estou sempre voltando para as coisas que eu amo. Nem que seja em sonhos.

E ela me deu aquele abraço macio. E com um dedo secou a única lágrima que contornava minha face já tão cansada de chorar por tais questões.


Ausência

Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

E saí em busca novamente da minha paz aleatória e cotidiana da qual ela faz parte.



A mulher que cozinha pra mim.

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