sábado, 18 de abril de 2009


A memória é algo persistente. Ás vezes quando estamos sentados diante de uma pessoa que nos cita algum momento ou situação de nossas vidas não somos capazes de lembrar. Dependendo do momento não podemos nem sequer pensar...

Foi muito interessante a ultima vez que me passou isso: era uma noite, uma terça-feira qualquer.

Eu estava diante de algo que eu jamais pensei que fosse acontecer. Milhares de sentimentos e sensações mesclaram-se em meu cérebro. Eu já não ouvia o que ele me dizia. O que eu via era que estava muito mais muito longe de mim naquele momento. Estava em algum lugar muito tranqüilo e cheio de rosas. Eu o olhava e minha memória se lembrava de algo que eu nunca havia vivido, lugares onde nunca havia estado e sensações que em algum lugar eu havia perdido... Essas sensações que nascem conosco e que por alguma razão nós tentamos esconder, mas que insistem em permanecer ali naquela pequena zona do córtex cerebral.
Esse vão escuro que é toda nossa vida. Quando alguma coisa é gravada em nossa memória, permanece para sempre.

Por exemplo, Malone dizia que já não era capaz de se lembrar de rosto dela. Estiveram tanto tempo juntos, mas sua face lhe era estranha. Mas a nítida e física sensação de que ela sempre estaria sentada na velha praça onde a vira pela última vez permanecia nele. O momento em que seu vão se iluminava era tão breve que quando se lembrava dela, da sua beleza indescritível e invisível, ele não era capaz de raciocinar e a lembrança se esvanecia, passava como as horas de um dia ensolarado. Mas ele, ironicamente, se lembrava de todas as suas coisas inventadas, como naquele tarde, há muitos anos, quando seu pai lhe ensinava a andar de bicicleta.

Eu também me lembro de minhas coisas inventadas. Eu me lembro ainda de Malone, que até hoje não sei quem foi que o inventou, se fui eu ou ele. Mas com o passar do tempo, eu percebi que havia coisas que eu me lembrava somente se quisesse lembrar. Como aquela determinada rua que passei com alguém que esteve comigo e que provavelmente decidiu esquecer-se de mim. Pois tudo aquilo que esquecemos ou lembramos é diretamente uma escolha nossa.

Se eu pudesse concluir algo sobre esse episódio que ainda vive em minha memória, essa terça-feira insignificante na vida do mundo, eu diria que o que aconteceu foi que minha memória por um momento quis parar e registrar aquilo que via, antes que o tempo pudesse passar e tirá-la de mim. É certo que não poderei esquecer aquele rosto. Ele era o efêmero instante, um caco de vida em meio ao inevitável destino comum de nós, homens.

Quando lhe contei, Malone chorou descontroladamente sem vergonha de que eu o estivesse olhando. Ele estava vivo novamente, só não conseguia admitir-se isso.




Dedico a Juan, alguém que não foi lembrado naquela noite. E dedico o pranto, imenso e sincero, a alguém que insiste em permanecer em minha memória.

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